quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Da Síria em guerra para Grécia neonazista: "Queremos ir embora, não dá mais para ficar aqui" 26/12/2012


Nermeen pegou dinheiro do pai e fugiu do país. Caiu na Grécia. Mal sabia que escapara de uma guerra para entrar em outra


"Está com fome?", perguntou ela, com um inglês arrastado. Sem esperar minha resposta, virou-se rapidamente e, segundos depois, ofereceu-me um falafel quentinho na noite morna de Atenas. Embrulhado no guardanapo, o bolinho frito, feito na hora e saboroso, continha uma simbólica dose de ativismo antifascismo.
Nermeen Alkasmi tem 26 anos e uma cicatriz óbvia pra quem conversa com ela por mais de cinco minutos. Ao falar do primo, baixa a cabeça. Os olhos, que antes brilhavam, escurecem com a dor da perda. Ele morreu em Homs, sua cidade natal, lutando pela oposição. Foi mais uma vítima da guerra civil na Síria.

Assustada, com medo de ser a próxima, Nermeen pegou dinheiro do pai e fugiu do país. Na peregrinação, empacou na Grécia. Mal sabia que escapara de uma guerra para entrar em outra. Ela reconhece os novos inimigos pela roupa preta. São membros do partido neonazista grego Aurora Dourada, que aterrorizam os imigrantes.
Roberto Almeida/Opera Mundi

Nermeen e Ahmed, em Atenas: "A Grécia já foi ótima. Hoje o que vemos nas ruas são bárbaros. Pessoas que querem nosso mal"

Por usar hijab, é presa fácil. Está sempre na mira e não nega o medo de caminhar pelas caóticas ruas de Atenas. Na comunidade muçulmana, a garota encontrou refúgio com o novo amigo Ahmed Kabani, de 33 anos, há dez na capital grega. Pai de dois filhos, trabalha em um cortume nos arredores de Atenas.

"A Grécia já foi ótima. Hoje o que vemos nas ruas são bárbaros. Pessoas que querem nosso mal. Claro que não são todas, mas uma coisa é clara: quero ir embora", sentenciou Kabani. Nermeen concorda e diz sonhar com a Suécia ou o Reino Unido. Quer ser tratada com refugiada de guerra e ensinar ao mundo que o islã não faz mal às pessoas.

A conversa com Opera Mundi acabou assim que Nermeen recebeu uma mensagem no celular. Seu noivo informava sobre o espancamento de um amigo. Antes animada por poder falar inglês, língua que estudou ainda na Síria, a imigrante despediu-se ao pé da Acrópole já calada e sem brilho. A violência comeu sua língua.

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